Geraldo Simplício chega aos 80 como símbolo autêntico de uma Nova Friburgo que respira e inspira a mais pura arte

Foto de Girlan Guilland, em Setembro 2002, o escultor em seu “Jardim do Nêgo”

Texto e foto: GIRLAN GUILLAND            

As mesmas montanhas que deram ao Brasil e ao mundo, no final do século XIX, um dos maiores nomes da pintura modernista – Alberto da Veiga Guignard – embora tenha vivido muito pouco entre nossas serras, mais de 70 anos depois acolheram um genial artista que adotou Nova Friburgo e foi por ela adotado. Hoje, mais de meio século depois, sua obra e ele próprio tornaram-se referências, praticamente como parte indissociável da paisagem de belezas naturais desses vales inspiradores. Sua arte singular o transformou num ícone, não só no Brasil, mas internacionalmente.

Iniciando como escultor em barro e madeira, nosso artista partiu para o inusitado ao moldar nos barrancos de sua propriedade – os “Jardins do Nêgo” – figuras tridimensionais, recobertas de musgo natural, que ganharam notoriedade muito além de nossas fronteiras. Sim, ele é Geraldo Simplício, cearense de nascimento de sua pequena Aurora, região do Cariri, mas friburguense por adoção, hoje representando tudo o que há de melhor e positivo em nossa região. Não é exagero dizer que Nêgo é o remanescente de uma Nova Friburgo, onde as manifestações e efervescências artísticas deram certo.

Reconhecimento: 1ª Feira de Arte na trajetória de nosso gênio

            A começar que a Cidade descobriria e confirmaria o seu talento durante a 1ª FANF – Feira de Artes de Nova Friburgo, realizada a partir de 16 de outubro de 1971, se estendendo por 55 dias ininterruptos (até meados de dezembro daquele ano), superando as expectativas até de seus próprios organizadores. Com exposição de artes plásticas e artesanato, espetáculos de música, dança e teatro, a Feira foi um dos grandes acontecimentos artístico-culturais locais, firmando-se como um movimento de vanguarda durante quase toda a década de 1970. E “Nêgo” estava lá com sua humildade quase simplória, expondo seus trabalhos ao mesmo tempo que a um canto do salão de exposições de nosso também emblemático Centro de Arte, esculpia, dando forma a seus personagens e criações.

Mas a trajetória de Geraldo Simplício tem capítulos antecedentes, que merecem ser revisitados. Do menino que aprendeu a moldar no próprio barro amassado pelas carroças que passavam pela rua de chão batido em que morava, reproduzindo animais, a boiada, vaqueiros e outras figuras do cotidiano de sua infância e dos amigos com quem brincava, até o aprendiz de sapateiro, que se tornaria restaurador das imagens do museu sacro da igreja de sua terra natal, a convite do padre Francisco Luna Tavares, que descobriu seu ofício de confeccionar peças, entre as quais pernas, braços, pés e mãos para os devotos cumprirem suas promessas na capela.

Daí para Juazeiro do Norte, a “Terra do Padim Ciço”, mais do que um pulo, foi um passo certeiro e decisivo. Porteiro do Colégio Salesiano, recebia “dormida” e comida, ao mesmo tempo que desenhava e esculpia em barro, o artista já se firmava ao produzir sua primeira escultura em madeira, naquele emblemático ano de 1965. Do Seminário São José, no Crato, à primeira exposição em Fortaleza, em 1967, até a exposição no Recife, no ano seguinte. Surge a oportunidade de vir para o Sudeste. Expôs na Galeria Escada, no Rio, onde conheceu Cecília Falk de tradicional família da colônia alemã friburguense. Ela o convida a vir para Nova Friburgo e lhe dá condições de trabalho. Ele chega à cidade em 1969, no auge de seus 26 anos.

Não demorou muito para estar totalmente incorporado à cena friburguense. Exercendo e desenvolvendo sua arte, fazendo contatos, conhecendo pessoas, fazendo amigos, entre os quais os saudosos Jaburu, Júlio César Seabra Cavalcanti; Girlam Miranda, Paulo Carvalho, o casal de artistas plásticos Hans e Miriam Etz só para citar alguns. Em 1981, Nêgo transferiu-se para Campo do Coelho, no 3° Distrito friburguense, e nos barrancos de sua propriedade às margens da Terê-Fri (RJ-130), iniciou o magistral trabalho em esculturas na terra, imprimindo uma arte que se tornou seu referencial a ponto de levá-lo, em 2014, para as páginas do jornal britânico “The Guardian”, como o único atrativo do Estado do Rio, entre 13 destinos de Norte a Sul do Brasil, apontados pelos próprios leitores.

Neste domingo, 2 de abril, ao entrar para o seleto grupo dos octogenários, Nêgo recebe uma singela homenagem de amigos, admiradores, de “conterrâneos” friburguenses que se sentem honrados em tê-lo por perto, em respirar o mesmo ar das Montanhas de Guignard. Será um ato singelo, mas repleto de simbolismos, o principal deles certamente será o de mostrar o quanto o artista se enraizou em nossa paisagem. Oito décadas se passaram, mais de cinco locais. Nêgo já se eternizou entre nós, na genialidade de suas obras.

SERVIÇO:

“Nego faz 80” – Evento neste domingo, 2/4, das 12h às 17 horas

Cadima Shopping – Promoção da Alcas – Associação de Lojistas

15 h e 30 min: apresentação da Camerata Feminina da Banda Euterpe

“Jardim do Nêgo” – km 55 / RJ 130 (Terê-Fri) – Campo do Coelho

Visitação todos os dias da semana: 8h às 17h / Informações: (22) 2543-2253