Gestão, responsabilidade e confiança: o que a crise do metanol nas bebidas ensina ao setor gastronômico

Por Caio Fontenelle
Os recentes casos de intoxicação por metanol nas bebidas alcoólicas do Brasil causaram um abalo profundo na população e, consequentemente, no setor gastronômico. Infelizmente, a falsificação de bebidas não é algo novo, mas ver esse problema chegar ao ponto de causar mortes foi algo que chocou a todos. Não se trata apenas de uma tragédia isolada — é um alerta sobre a importância da responsabilidade de quem vende e serve bebidas ao público.
Nos restaurantes que administro, houve uma queda de 50% na venda de destilados, com a maioria dos clientes migrando para outras opções, como o chope, por exemplo. No entanto, mais do que o efeito comercial, o episódio levantou uma reflexão essencial: qual é o nosso papel, como empresários, na prevenção desse tipo de problema?
A resposta está na gestão responsável. Um bom restaurante se constrói a partir das escolhas que se faz, especialmente em relação aos fornecedores. Eu trabalho com distribuidoras grandes e reconhecidas de alcoólicos, que compram diretamente dos fabricantes e, além disso, busco valorizar os bons produtores locais. Tenho completa noção de que essa relação de confiança é fundamental para ter tranquilidade no momento em que meu estabelecimento abre as portas para atender ao público.
Falsificação não é algo inédito: existe em roupas, bolsas, peças de carro, e também em bebidas. Mas é importante lembrar que falsificar ou comprar produto falsificado é crime. Se alguém oferece uma bebida muito abaixo do preço de mercado, há algo errado. É o mesmo princípio de quem compra uma peça de carro roubada: quem alimenta esse mercado é o comprador.
Já me deparei com ofertas de origem duvidosa, as quais sempre recusei. Essa é uma questão de postura empresarial. Buscar lucro por caminhos que podem não ser os mais assertivos não é o que vai garantir o sucesso de um negócio. O que realmente faz diferença é a boa gestão, o controle de custos e a escolha por produtos de qualidade.
Muitos estabelecimentos sérios — e eu incluo aqui meus concorrentes diretos — têm essa preocupação. A tragédia do metanol serve como lembrete de que ética e qualidade não são diferenciais, são obrigações. Quando o empresário escolhe um fornecedor duvidoso, além de colocar em risco a saúde do cliente, também põe à prova a reputação e longevidade do seu próprio negócio. Qualidade é uma questão de cuidado, compromisso consigo e com o próximo, e de autorresponsabilidade
É preciso criar uma cultura em que o barato que sai caro deixe de ser opção, tanto para quem vende quanto para quem consome. No fim das contas, a gestão de um bom restaurante precisa contar com ética e compromisso com quem está do outro lado do balcão. E isso é algo que não é possível conseguir por meios ilícitos, uma fórmula incapaz de ser falsificada.
*Caio Fontenelle é proprietário dos restaurantes Figueira, Oliv e Pepper Jack, de Blumenau (SC)






