Ensino à distância e a formação de professores: entre o acesso e a qualidade

Por Priscila Planelis
A nova política de ensino a distância (EaD), instituída em maio pelo Ministério da Educação (MEC), representa um passo importante para a regulamentação do setor educacional. Especialmente quanto à qualidade da formação docente no Brasil, os novos parâmetros podem ter efeitos contrários aos pretendidos e dificultar o acesso de estudantes que dependem da flexibilidade do formato remoto.
Nas últimas duas décadas, o EaD passou de exceção à regra no ensino superior brasileiro. Segundo o Censo da Educação Superior 2024, divulgado pelo Inep, as matrículas nessa modalidade cresceram 286,7% entre 2014 e 2024. O modelo democratizou o acesso ao Ensino Superior, especialmente para trabalhadores e moradores de municípios distantes dos grandes centros urbanos.
Para professores em exercício, que muitas vezes conciliam longas jornadas e baixos salários, o EaD se consolidou como alternativa viável para obter licenciatura ou complementação pedagógica. Em 2024, o curso de Pedagogia registrou 887.695 matrículas, das quais 733 mil, ou seja, 82,6%, foram realizadas na modalidade a distância.
A nova regra do MEC, aprovada no texto do Decreto nº 12.456/2025 introduziu diversas alterações na regulamentação do Ensino a Distância (EaD) e trouxe a vedação da oferta de cursos de licenciatura no formato a distância, o que pode prejudicar a formação de professores, principalmente dos estudantes em localidades remotas ou sem disponibilidade de tempo para frequentar polos educacionais.
O argumento do MEC ao afastar o formato EAD das licenciaturas tem fundamento na busca pela elevação da qualidade do ensino ofertado. Contudo, é preciso cautela para que a regulação não se torne barreira de acesso, afinal o Brasil precisa de mais professores, principalmente de professores do ensino médio com formação específica na área que lecionam.
Embora o objetivo seja assegurar maior contato com práticas pedagógicas e experiências formativas, a ausência de previsão para cursos totalmente a distância pode representar um obstáculo para estudantes e profissionais que dependem da flexibilidade do ensino remoto, sobretudo para aqueles que enfrentam longas jornadas de trabalho ou residem em regiões distantes dos polos educacionais. A política educacional deve equilibrar rigor acadêmico e inclusão, sob pena de restringir o acesso justamente de quem mais precisa.
O desafio, portanto, é aperfeiçoar a EaD sem retroceder. Não se trata de escolher entre controle e expansão, mas de desenhar políticas que garantam ambos. A regulação deve preservar a flexibilidade que transformou a EaD em ferramenta de inclusão, ao mesmo tempo em que promove rigor acadêmico e práticas pedagógicas consistentes.
Projeta-se, portanto, um cenário em que os cursos totalmente presenciais estão cada vez mais escassos e podem, no futuro, até mesmo acabar da forma como os conhecemos hoje, cedendo espaço para o modelo semipresencial como regra. É fundamental, no entanto, que essa evolução não comprometa a qualidade da formação nem a vivência prática que caracteriza a prática docente. Na expansão dos cursos a distância, o desafio está em harmonizar o avanço tecnológico e a democratização do acesso com a preservação de espaços de prática e convivência.
Também é fundamental reconhecer que as exigências de carga horária presencial e as barreiras geográficas continuam sendo desafios concretos para milhares de estudantes e professores. O ensino a distância precisa ser visto como uma ferramenta de diminuição de desigualdades e promoção da democratização da educação e, por isso, é preciso considerar essas particularidades.
A educação a distância consolidou-se como um vetor de inclusão e de qualificação docente. O futuro da formação de professores depende agora da capacidade do Estado de conciliar qualidade e equidade, reconhecendo que a democratização do ensino é também um requisito de justiça social.
* Priscila Planelis é advogada, especialista em Direito Educacional e secretária-executiva da Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (AMIES).






