Do discurso à ação: como as empresas podem avançar na equidade racial

Novembro é marcado pelo Dia da Consciência Negra, lembrado no dia 20, que homenageia Zumbi dos Palmares, líder do maior quilombo do período colonial e símbolo de resistência contra a escravidão. Muito além de uma data no calendário, o mês é uma oportunidade de reflexão, de proposição de mudanças estruturais na sociedade e de incentivo a ações concretas pelo combate ao racismo nas organizações.
Atualmente, segundo o IBGE, cerca de 56% da população brasileira se autodeclara preta ou parda. No entanto, mesmo sendo um país de maioria negra, essa representatividade ainda não se reflete nos espaços de decisão. Pessoas negras ocupam menos de 30% das posições de liderança e menos de 5% chegam a cargos executivos em grandes empresas. Essa discrepância evidencia um sistema estrutural que, historicamente, limitou o acesso e as oportunidades para pessoas negras.
De acordo com Ismael dos Anjos, consultor da CKZ Diversidade e especialista em masculinidades e raça, é nesse contexto que a abordagem de Diversidade, Inclusão, Equidade e Pertencimento (DIEP) ganha ainda mais relevância. “Promover a equidade racial no ambiente corporativo significa olhar para dados, reconhecer desigualdades e agir intencionalmente para mudar realidades. É uma jornada coletiva, que começa com consciência e se concretiza por meio de ações práticas”, destaca.
Segundo Ismael, grande parte das desigualdades permanece viva nos espaços de trabalho devido aos vieses inconscientes, ou seja, mecanismos automáticos de percepção, que influenciam decisões de lideranças e equipes de gestão. Quando aplicados à questão racial, esses vieses criam e reforçam barreiras invisíveis, mas persistentes, que dificultam o desenvolvimento e a ascensão profissional de pessoas negras.
Um dos exemplos citados por ele é o Pacto Narcísico da Branquitude, um tipo de viés da afinidade que ocorre quando lideranças e pessoas recrutadoras tendem a favorecer quem tem perfis semelhantes aos seus, seja em aparência, origem ou trajetória. Outro viés comum é o da competência, caracterizado pela dúvida ou subvalorização das habilidades de pessoas negras, o que leva à exigência constante de comprovação de excelência e, consequentemente, à descredibilização profissional.
O especialista da CKZ Diversidade reforça que o conceito de raça não se sustenta como uma categoria biológica, mas se desenvolve como uma construção social usada historicamente para classificar e hierarquizar grupos humanos. “O racismo no Brasil vai muito além de atitudes individuais implícitas ou explícitas. Faz parte do sistema e está enraizado nas instituições, normas e práticas culturais que atravessa todas as pessoas que vivem nessa sociedade”, destaca Ismael. No ambiente corporativo, o racismo estrutural aparece de maneiras distintas porém constantes, tais como:
Processos seletivos baseados em redes homogêneas
Padrões estéticos eurocêntricos como referência de profissionalismo
Falta de representatividade nos quadros de liderança
Ausência de políticas internas que garantam igualdade de oportunidades
“Precisamos tomar cuidado com os racismos cotidianos que nos cercam e trabalhar para quebrar essas desigualdades dentro das organizações por meio de ações intencionais. Isso implica em ter diagnósticos internos, estabelecimento de metas claras de representatividade racial em todos os níveis da empresa, registro e punição diante das microagressões, comentários racistas e piadas direcionadas às pessoas negras. Essa mudança exige ação por meio de espaços de escuta ativa, programas de mentoria, redes de afinidade e investimento em DIEP, mas cria condições reais para que pessoas negras possam se desenvolver, contribuir e prosperar no trabalho e na sociedade”, finaliza.






