Por Evandro Lopes

Num cenário saturado de mensagens, promessas e campanhas visualmente impecáveis, o que deveria conectar passou a cansar. A presença onipresente de marcas em nossos feeds, playlists e rotinas não tem sido suficiente para gerar vínculos reais. Ainda que a exposição nunca tenha sido tão ampla, a relevância parece cada vez mais escassa. Porque a construção de marca não é mais sobre aparecer, mas sobre significar, e muitas empresas ainda não perceberam essa virada.

De acordo com o relatório Meaningful Brands, realizado pelo Havas Group, 77% das marcas poderiam desaparecer hoje que ninguém sentiria falta. O dado revela mais do que um desinteresse pontual: expõe uma falha sistêmica na capacidade das marcas de ocuparem um espaço emocional legítimo na vida das pessoas. Isso acontece porque, apesar dos investimentos em estética, tecnologia e alcance, boa parte das empresas segue pautando seu branding em premissas ultrapassadas, aquelas que priorizam performance e controle, mas negligenciam escuta e afeto.

O maior risco, portanto, não vem da concorrência. Ele está dentro da própria organização, entranhado nas mentalidades que resistem a repensar o papel simbólico da marca. “Não é o seu concorrente que ameaça sua marca. É o modelo mental ultrapassado dentro da sua própria empresa.” Essa percepção, embora desconfortável, precisa ser dita. Continuar operando sob o velho paradigma, aquele que acredita que repetição gera lembrança e que visibilidade basta para gerar conexão, é insistir em uma lógica que não resiste ao novo comportamento do consumidor.

Esse novo consumidor não apenas deseja experiências coerentes, como também passou a cobrar responsabilidade das marcas com relação ao que elas defendem. O Edelman Trust Barometer revela que 71% das pessoas perdem confiança em empresas que divulgam propósitos que não são praticados de forma concreta. Ou seja, não basta mais comunicar valores: é preciso viver esses valores em cada ponto de contato, em cada decisão, em cada atitude. A dissonância entre discurso e prática, antes tolerada, agora compromete não apenas a imagem, mas a legitimidade da marca.

No entanto, muitas empresas continuam reféns de uma lógica de entrega constante, como se o volume de conteúdo pudesse compensar a falta de substância. Byung-Chul Han descreve essa dinâmica como a “sociedade do desempenho”, onde a busca por produtividade se transforma em autoexploração. O branding, inserido nesse contexto, muitas vezes se converte em uma vitrine de excessos: discursos inflados, campanhas ansiosas por engajamento, e uma constante reinvenção que esconde a ausência de uma base sólida.

Para quebrar esse ciclo, é preciso mais do que um novo posicionamento ou uma identidade visual redesenhada. É necessário rever o sistema interno de crenças que sustenta a marca. Isso implica escutar com profundidade, dar espaço para o silêncio, abandonar a lógica da sedução publicitária e assumir, de forma autêntica, a própria verdade. Quando a marca é vivida de dentro para fora, ela começa a ser percebida como algo mais do que uma promessa: torna-se presença.

Essa mudança não é apenas estratégica, mas também cultural. Ela exige disposição para romper com a ideia de que branding é um exercício de convencimento, quando na verdade é uma prática de coerência. As marcas que resistem a essa transição permanecem visíveis, mas irrelevantes. As que têm coragem de atravessá-la se tornam memoráveis, não por serem perfeitas, mas por serem inteiras.

No fim, a marca que permanece não é a mais presente no imaginário coletivo, mas a que consegue refletir com consistência o que é, o que acredita e o que entrega. Para isso, é preciso abrir mão da performance constante e reconhecer que, na maioria das vezes, o cliente já não busca mais o que impressiona, ele procura o que é verdadeiro. E só quem se permite ser real será, de fato, lembrado.

*Evandro Lopes é CEO da SLComm, empreendedor, palestrante e consultor.