As críticas ácidas da personagem Odete Roitman, no remake da novela Vale Tudo, reacenderam um debate real: o que de fato leva muitos clientes a saírem frustrados dos restaurantes? Embora fictícias, as reclamações da empresária — música alta, ambiente abafado, pratos temperados como se fossem para dragões e o uso indiscriminado da palavra “gourmet” — refletem situações que qualquer frequentador assíduo já viveu e que lotam sites de avaliação e redes sociais.

Para Marcelo Marani, professor e CEO da Donos de Restaurantes, e um dos maiores especialistas em gestão de bares e restaurantes da América Latina, essas falhas são mais comuns do que se imagina e, pior, poderiam ser facilmente evitadas. “Esses erros refletem a falta de um olhar estratégico por parte de muitos empresários. O cliente percebe imediatamente quando o restaurante prioriza só o cardápio e ignora o ambiente, o atendimento e a coerência da proposta”, afirma.

Na visão de Marani, muitos donos de restaurantes acreditam que resolverão tudo com cardápios dignos de reality show gastronômico ou com reformas de revista. Mas a decisão do cliente de voltar ao local depende muito mais de detalhes corriqueiros. “O cliente volta quando percebe consistência, organização e cuidado em todos os aspectos do atendimento. Isso raramente exige investimento alto, mas sim disciplina de gestão”, destaca.

Outro descuido clássico, segundo o especialista, é a falta de controle de dados básicos: o tempo médio entre o pedido e a entrega do prato ou até mesmo saber qual receita dá lucro e qual só ocupa espaço no cardápio. “É como servir vinho ruim em taça fina: de nada adianta ter a estrutura se a operação não funciona”, brinca.

A falta de processos claros também compromete a experiência do público. “Se cada turno inventa um jeito novo de dobrar o guardanapo ou de receber o cliente, o padrão de qualidade desaparece. Padronizar procedimentos, desde a arrumação das mesas até a abordagem, cria identidade e reduz reclamações”, pontua Marani.

Soluções práticas para problemas comuns

Controle do som ambiente

Uma das queixas eternas de Odete e de muitos clientes é o excesso de barulho. De acordo com o Procon-SP, muitos restaurantes ultrapassam 70 decibéis, tornando a refeição uma batalha para quem quer conversar sem berrar. “Não é preciso gastar fortunas com isolamento acústico”, orienta Marani. “Basta reposicionar caixas de som, evitar superfícies muito reflexivas, ajustar o volume e, se possível, criar áreas mais silenciosas.”

Climatização e conforto

Ambientes quentes como forno ou frios como câmara frigorífica afastam qualquer freguês. Pequenas atitudes, como revisar os aparelhos de ar-condicionado ou usar cortinas e ventiladores de forma estratégica, fazem toda a diferença.

Uso responsável do termo “gourmet”

“Se até o pão com mortadela da esquina virou gourmet, é sinal de que o termo perdeu o sentido”, ironiza Marani. Ele defende a honestidade e a transparência no cardápio, valorizando mais a qualidade e a origem do produto do que o rótulo pretensioso.

Equilíbrio nos temperos

Segundo a consultoria Food Industry Report, 58% dos clientes preferem pratos equilibrados. “Evite que o prato tenha mais pimenta do que o samba da escola de samba do bairro”, brinca Marani. O segredo é padrão e treinamento da equipe.

Atendimento como fator-chave de fidelização

Pesquisa do Instituto Qualibest mostra que 72% dos brasileiros escolhem restaurantes pelas avaliações online. “O básico funciona: sorriso, educação e agilidade. Não custa nada e rende muito”, reforça o especialista.

Entre as ações simples e que podem ser aplicadas de imediato, Marani recomenda o uso de checklists diários para garantir limpeza e organização, o monitoramento do tempo de atendimento e a escuta ativa das queixas dos clientes. “Quando donos de restaurantes adotam essas práticas básicas, mas eficientes, eles conseguem aumentar a satisfação do cliente e até o ticket médio, sem necessariamente fazer grandes investimentos”, conclui.