O que é a beleza?
Por Leonardo de Moraes
Há quem diga que somos geneticamente programados para uma determinada percepção de harmonia, certos códigos áureos que transcendem ditames sociais. Crianças de todas as origens têm certos instintos estéticos voltados a superfícies homogêneas, formas arredondadas e de cores amenas. Talvez haja uma garantia evolucional da busca pelo seio e rosto da mãe, pelo aconchego amoroso e pela nutrição.
Mais velhos, porém, toda simplicidade se esvai e somos afetados por conceitos familiares, por dinâmicas no ambiente escolar e bombardeados por um marketing feroz de formas e comportamentos supostamente “vencedores” – nada além de narrativas criadas para vender produtos e serviços, e só.
Saímos da adolescência doutrinados por um contexto social caótico, impondo a nós mesmos padrões estéticos irreais ao nosso físico e aos nossos desejos. Corroemos nossos afetos, nosso caminhar, nosso conceito de felicidade. Milhões passam a vida em autopunição, privando a si mesmos da livre expressão do seu ser, em razão de um suposto não-pertencimento estético.
Mas, e a beleza, o que é? Sou artista visual e escritor, vivo meus dias treinando os olhos e ouvidos para testemunhá-la em formas ou comportamentos humanos. A beleza se esconde na sutileza, na amorosidade, no sentimento; é incapaz de ser contida, engarrafada ou padronizada. É uma chama, um charme, um “je ne sais quoi”, expressão que os próprios franceses transformaram em substantivo, na impossibilidade de conceituá-la.
O que ela é, de fato, não sei e jamais saberei. Estou certo, porém, que ela não mora em padrões, opressões, regras, exigências ou modelos. E que ela não suporta nem gaiolas, nem algemas.
*Leonardo de Moraes é mestre em Direito do Estado, professor de Direitos Humanos; também é artista visual, roteirista e autor do romance Tia Beth, sobre as dores da violência no Brasil