Tradicionalmente, pais e mães são vistos como figuras de amor e proteção incondicionais, mas essa idealização ignora casos em que, infelizmente, a relação entre pais e filhos pode ser tóxicaa. A sociedade tem dificuldade em aeitar que nem tosos os pais correspondem a esses ideais, e falar sobre isso pode ser libertador para quem viveu ou vive em ambientes familiares disfuncuionais. “Relações familiares tóxicas podem afetar profundamente o desenvolvimento emocional das pessoas, resultando em baixa autoestima, problemas de confiança e dificuldades em construir relacionamentos saudáveis”, relata a psicóloga Bárbara Couto mestre em Psicologia Clínica e Saúde pela Universidad Europea del Atlantico (UNIAtlântico), da Espanha.

Filhos de pais tóxicos podem enfrentar uma série de consequências emocionais e psicológicas que se refletem ao longo de toda a vida. Crescer em um ambiente tóxico afeta diretamente a autoestima, a confiança e a capacidade de se relacionar de maneira saudável com outras pessoas. “Muitas vezes, esses filhos acabam desenvolvendo transtornos como ansiedade e depressão, além de uma predisposição a entrar em relacionamentos abusivos, pois têm dificuldade em reconhecer o que é um relacionamento saudável. A convivência prolongada com pais tóxicos pode levar à perda do senso de valor pessoal, criando um ciclo de autocrítica e sentimento de inadequação”, explica a psicóloga.

Reconhecer a relação e as características do abuso é fundamental

Bárbara explica que muitos filhos chegam ao consultório sem perceber o quanto essa relação os adoece, sentindo culpa e incapazes de questionar a educação que receberam. A sociedade ensina que os pais sempre têm razão, e que se deve respeitá-los incondicionalmente, mesmo que sejam abusivos, como se por serem filhos devem normalizar qualquer comportamento de seus pais. “E qualquer pessoa pode ter filhos, até pessoas não boas. Gerar um filho não transforma a personalidade de ninguém. Em terapia, eles aprendem que podem estabelecer limites e que cuidar da própria saúde mental é mais importante do que manter uma relação disfuncional com os pais”, mostra Bárbara.

Mas para saber se está em uma relação tóxica com os pais, é preciso ter conhecimento sobre as características dos abusos. Há vários tipos de pais tóxicos: abusivos, controladores, manipuladores e negligentes. “Os pais abusivos são aqueles que recorrem a violência, seja física ou verbal, com xingamentos, palavras desrespeitosas, ameaças, manipulação, gerando uma sensação constante de medo e insegurança nos filhos. Os pais controladores não permitem a autonomia, restringem a liberdade e a individualidade dos filhos em cada aspecto, o que impede o desenvolvimento saudável da autoconfiança e identidade. Já os pais manipuladores usam estratégias de culpa, chantagem emocional e inversão de papéis para manter o controle, fazendo os filhos acreditarem que são responsáveis pelo bem-estar e a felicidade dos pais. Os pais negligentes não conseguem prover o mínimo de cuidado e apoio emocional, o que deixa os filhos sem um alicerce de proteção e segurança, gerando sentimentos de abandono. Cada um desses comportamentos traz impactos devastadores, e, em todos os casos, afasta os filhos de uma relação saudável com os pais”, esclarece Bárbara Couto.

Fatores sociológicos e culturais podem contribuir para comportamentos tóxicos de pais

Muitas vezes, a sociedade encara uma educação punitiva e violenta como necessária para “ensinar o certo” ou impor limites. Mas é fundamental entender que existe uma enorme diferença entre disciplina e abuso. Disciplinar com amor e respeito, oferecendo limites com compreensão, fortalece a relação e desenvolve adultos mais saudáveis e equilibrados. “Ainda hoje, muitos pais acreditam que educar com castigos e punições severas é a única maneira eficaz, mas isso pode causar graves traumas. Os pais são os responsáveis pelo tipo de afeto que receberão dos filhos no futuro; quando são presentes, justos e compreensivos, e aceitam seus filhos como são, construindo limites com amor, eles criam uma base para relações saudáveis e r espeitosas”, afirma a psicóloga.

Como lidar com pais tóxicos sem se afetar por eles?

Não existe uma forma de conviver com pais tóxicos sem ser afetado, pois esses comportamentos já afetam o desenvolvimento emocional da criança desde cedo. Aprender a impor limites, mesmo que isso seja desafiador, ajuda a preservar a saúde mental. Em casos mais graves, como pais que apresentam transtornos de personalidade e comportamentos abusivos recorrentes, muitas vezes, o afastamento é a única medida que deve ser tomada. “Afastar-se não significa abandonar ou desrespeitar, mas sim priorizar o próprio bem-estar e romper com padrões de abuso que causam sofrimento contínuo. Cuidar de si e aprender a dizer “não” são atos de coragem e autopreservação. Por isso, em alguns casos, o afastamento não deve ser encarado como uma atitude errada, mas sim como uma m edida de autopreservação e proteção da saúde mental”, aponta ela.

Honrar pais e mães tóxicos pode ser possível, mas não no sentido de conviver ou manter uma relação próxima. É possível respeitar e manter uma relação mais saudável, porém, para isso, é fundamental que essa relação seja mantida à distância e com limites bem estabelecidos. “Honrar um pai ou mãe não significa aceitar comportamentos abusivos ou abrir mão da própria saúde mental. É possível honrar sua existência e até compreender suas dificuldades, mas sem se submeter a um relacionamento que traga sofrimento. Esse tipo de distanciamento permite preservar o respeito sem comprometer a integridade emocional do filho”, finaliza Bárbara Couto.

A psicóloga Bárbara Couto

 Bárbara Couto é Graduada em Psicologia pelo Centro Universitário de Brasília (UNICEUB) e tem Mestrado em Psicologia Clínica e Saúde pela – Universidad Europea del Atlantico (UNIAtlântico), da Espanha.

Ela também tem Especializações em Terapia Cognitivo Comportamental e Neurociências e em Comportamento, ambas pela PUC-RS e em Neuropsicologia Clínica, pela Capacitar.

Bárbara Couto escreveu dois livros, editados pela Drago Editorial, em versões impressa e e-book. O primeiro “Permita-se”, sobre relacionamentos abusivos e libertação emocional. E o segundo “Aceita-se”, sobre tabus e necessidade da autoaceitação para sobreviver em uma sociedade que tem dificuldade em aceitar.